FIGURAS
No Dia de São João, os rituais e danças contam com mais de 700 figurantes. Quase todos são de Sobrado ou possuem uma ligação com esta terra. Cada peça tem a sua função e esta tradição é extraordinária e peculiar porque todos os figurantes vivem este dia em paz, dando o melhor de si ao papel que vão desempenhar.
Velho da Bugiada
O Velho da Bugiada, patriarcal e de aparência sacerdotal e magnificente, é o ancião do povo cristão, liderando-o e orientando-o nos seus desígnios. Não é chamado de rei dos Bugios mas, pela sua conduta e entendimento, é o “escolhido” pelo seu povo como seu patriarca e chefe. É um dos protagonistas da festa.
O Velho da Bugiada utiliza umas vestes distintas e sublimes, diferenciando-o dos restantes Bugios, sendo a única personagem da festa que utiliza duas máscaras (“caretas”) diferentes ao longo do dia. Durante a manhã utiliza uma máscara mais alegre em contraste com a careta da tarde que é mais inquieta e abalada em razão do momento bélico e dramático que culmina com a sua prisão.
Bugios
Os Bugios são os elementos da formação cristã, sendo composta por homens, mulheres e crianças de ou com afinidade a Sobrado. A Bugiada é a formação opositora dos Mourisqueiros. Não existem limitações quanto à idade, gênero e estado civil, sendo habitual saírem à rua cerca de seiscentos Bugios.
A Bugiada representa a alegria, a exuberância, o exagero, a subversão e a desordem. Os trajes apresentados são um misto de cor e brilho, onde o exagero é a característica principal. Podem usar outros acessórios/objetos na mão, consoante a criatividade de cada um, sendo que o objetivo é amedrontar os Mouriscos.
Os Bugios dividem-se em duas fileiras, sendo comandados hierarquicamente pelo Velho da Bugiada e pelos “lugares” por ele designados: Guias (par dianteiro) e Rabos (par derradeiro).
Músicos da Bugiada
Na Bugiada, as danças e movimentos dos Bugios e do Velho da Bugiada, são executados em sincronia com melodias tocadas por um grupo de músicos, também denominado de Orquestra ou Arroquesta como se dizia antigamente.
Este grupo é variável quer em número como em género, e os instrumentos utilizados incluem violas braguesas (ou ramaldeiras), violinos e rabecas. Relativamente ao vestuário usado pelos músicos, não existem regras rígidas, tentando-se manter os trajes típicos ou folclóricos portugueses de antigamente.
Crianças
Desde os anos 50 que emergiu a figura das crianças no momento da Prisão do Velho. Tratam-se de Bugios de tenra idade que vão “alimpar as bagadas ao Velho” ou seja as suas lágrimas, abraçando-o múltiplas vezes e abandonando o Palanque dos Bugios, desolados porque o Reimoeiro se mantém inflexível. Pela sua inocência e pela sua teatralidade, estas crianças-bugio conseguem emocionar todos os que assistem à Prisão do Velho.
Reimoeiro
O Reimoeiro ou Rei Mouro é o líder dos Mourisqueiros. O seu poder régio sustenta-se na sua autoridade militar, na austeridade da sua conduta e no rigor com que executa as suas danças e movimentos. De cara descoberta, séria e sisuda, representa uma personagem que, ao longo da Lenda da Bugiada e Mouriscada, se distingue pela rigidez e inflexibilidade.
A tradição exige que tenha que seja Sobradense, do sexo masculino e solteiro, sendo um dos protagonistas desta festa.
Mourisqueiros
Os Mourisqueiros são Jovens sobradenses do sexo masculino, solteiros e constituem um exército de composto por cerca de 4 dezenas de homens. A liderar esta fação está o Reimoeiro.
A Mouriscada é a formação que se opõe aos Bugios. É um grupo bem mais reduzido que o dos Bugios mas muito mais ordenado e disciplinado militarmente. As suas danças são movimentos sincronizados e ultimamente cada vez mais de perceção militar.
Os Mourisqueiros organizam-se por pares, destacando-se em termos hierárquicos os sete elementos mais destacados: Reimoeiro (líder do exército), Guias (primeiro par a seguir ao Reimoeiro e futuros chefes da mouriscada nos anos seguintes), Meios (par de Mourisqueiros que se encontram na posição central da fação) e Rabos (último par da Mouriscada). São necessários sete anos (no mínimo) para se atingir o lugar de topo na hierarquia (Reimoeiro), sendo necessário percorrer todos os lugares do exército.
Recriando o “Roubo do Santo” os Mourisqueiros são os únicos que podem carregar o andor de São João na procissão, carregando igualmente os outros andores.
Caixa dos Mourisqueiros
Na Mouriscada, tanto o tambor que é tocado como uma pessoa que usa o instrumento, denomina-se de Caixa. Por tradição, tem sido sempre um homem a tocar a caixa, conduzindo parte das danças mouriscas através das suas melodias bélicas. Sempre a pé, o seu tronco suporta o tambor que é tocado por duas baquetas. Em algumas partes das danças encontra-se no mesmo local a tocar, mas outras toca em movimento. É uma das figuras centrais da Mouriscada, uma vez que intervém e acaba por definir, com o som da caixa os movimentos rítmicos e danças dos Mourisqueiros, não podendo parar nem errar para não por em causa a boa execução das danças por parte dos mouriscos.
Banda Musical de S. Martinho do Campo
Desde que se conhece a existência da Bugiada e Mouriscada, sempre existiu uma banda filarmónica presente e inserida nas festividades. Inicialmente era a Banda de Baltar que participava, tocando o Hino de São João. Posteriormente foi a vez da Banda de Música de Cete (por vezes chamada de Banda dos Bombeiros Voluntários de Cete) e a Banda de Vilela. No entanto, foi a Banda Musical de S. Martinho do Campo que, em meados do séc. XX, se afirmou no coração dos Sobradenses, tocando o Hino de São João de uma forma que os Sobradenses consideraram mais condizente da original de antigamente.
A Banda de Campo, como também é chamada, participa em momentos relevantes da festa, nomeadamente na Procissão, a Dança de Entrada, a chegada das formações aos seus “palanques” e a Prisão do Velho. Apesar de ser da freguesia vizinha, tanto os músicos como os Sobradenses consideram a Banda de Campo como sua, como parte integrante da festa.
Doutores da Lei
Durante o conflito entre Bugios e Mourisqueiros, os sábios Doutores da Lei, também conhecidos por Advogados, assumem uma função mediadora. Cada uma das formações tem o seu advogado, distinguindo-se um do outro pelo vestuário usado. Ambas as personagens são mascaradas e usam vestimentas condizentes com as suas funções.
Uma vez que as negociações não são bem-sucedidas no Palanque dos Bugios, visto que os próprios advogados não chegam a nenhum acordo, sucede-se o assalto a este palanque por parte do Reimoeiro.
Narrador
Para uma melhor compreensão da Prisão do Velho, tem sido habitual, desde à várias décadas, a narração da encenação e até uma contextualização histórica e social tanto da festa como sobre a povoação. Habitualmente, o narrador é membro da comunidade de Sobrado, mas por vezes tem-se recorrido a elementos externos. Relativamente à narração, isso ocorreu de duas formas distintas: por leitura, seguindo um “guião” previamente estabelecido ou por relato, ou seja, interpretação/ improviso de quem exerce essa função. O objetivo é sempre envolver quem contempla a Prisão do Velho, através de informação, por vezes carregada de emoções, de modo a criar um ambiente comovente de acordo com a narrativa.
Mensageiro
O Mensageiro é o cavaleiro que “Corre as Embaixadas” no início do conflito entre Bugios e Mourisqueiros. Trata-se de um homem, parcialmente trajado de Mourisqueiro, sem barretina. Não tem de ser solteiro como os Mourisqueiros, uma vez que se encontra ao serviço das duas formações, sendo aliás escolhido pelo Velho da Bugiada.
A sua função é percorrer, a cavalo, múltiplas vezes o trajeto entre os palanques dos Bugios e dos Mourisqueiros, transportando mensagens representadas por folhas de plátano e espetadas na sua espada, tentando-se a paz.
Serpe
A Serpe é uma das figuras mais relevantes da Bugiada e Mouriscada. Trata-se de uma personificação mitológica, alongada e de tons esverdeados, com uma cauda longa e língua vermelha. Possui ainda uma fita vermelha em redor da cabeça e fitas da mesma cor na cauda. Possui quatro barras laterais de suporte de madeira que podem aludir às quatro patas de um lagarto ou de um dragão, já que as serpentes/ cobras não possuem patas.
Apesar de, habitualmente, os dragões e serpentes estarem associados ao mal e ao pecado original, na Bugiada e Mouriscada, numa outra inversão da realidade, a Serpe representa o “Milagre de São João”, uma vez que os Bugios utilizam este mostrengo para libertarem o Velho da Bugiada.
Cego
O Cego é um dos elementos que integra a Dança do Cego ou Sapateirada. Segundo a tradição é uma figura itinerante, que vive da boa vontade das povoações por onde passa, sendo assistido pelo seu Moço, uma vez que é cego.
Como é cego, várias peripécias se sucedem, travando um duelo com o Sapateiro, sendo acusado do rapto da sua mulher. Durante a trama, a verdade vem à tona e ele consegue escapulir-se, seguindo a sua vida nómada e errante.
Moço do Cego
O Moço do Cego é o indivíduo que auxilia o Cego durante as suas viagens de terra em terra, guiando-o através de uma vara. Segundo a tradição, é ele que rapta e foge com a Mulher do Sapateiro, permitindo que o Cego seja acusado injustamente. Apesar da paixão loca, esta é efêmera, uma vez que no fim da história a Mulher volta para o seu marido.
Sapateiro
O Sapateiro é uma personagem da Dança do Cego ou Sapateirada, sendo facilmente identificado, uma vez que usa máscara e surge acompanhado de sua linda Mulher. É um homem trabalhador, respondão e até brejeiro, uma vez que sempre que o público brinca ou troça dele, ele sempre responde na mesma medida. A sua profissão de conserto de sapatos é representada na trama, de forma encenada e cómica, envolvendo-se posteriormente num duelo com o Cego.
Apesar do infortúnio da traição e fuga da sua mulher com o Moço do Cego, o Sapateiro perdoa-a e aceita-a novamente.
Moço do Sapateiro
O Moço do Sapateiro é a figura que acompanha o Sapateiro, normalmente um Bugio e trajado como tal, levando consigo uma cesta com sapatos velhos, os instrumentos necessários para o Sapateiro exercer a sua função bem como o banco em madeira em que se senta o seu amo. No âmbito da trama, o Moço tira o banco ao Sapateiro antes deste se sentar, fazendo com que este caia aparatosamente no chão, sendo repreendido pelo sucedido. Tal como os restantes personagens desta encenação, é escolhido pelo Velho da Bugiada.
Mulher
A Mulher do Sapateiro ou Fiadeira é um homem travestido e mascarado que carrega um fardo de palha, fiando-o com um pau curto.
Na representação cénica, a Mulher é raptada pelo Moço do Cego, mas como também não se encontrava satisfeita com o seu marido, acaba por fugir com ele de uma forma um pouco voluntária, traindo-o. Durante este momento, é “falada” e “atacada moralmente” pela sociedade, mas pouco se importando com a situação. No final, a história dá uma reviravolta e ela volta para o seu marido, que a aceita.
ESTARDALHADAS/ ENTRAJADAS
As Estardalhadas ou Entrajadas, também chamadas por alguns de “Crítica”, referem-se à sátira ou crítica social que um ou mais grupos de indivíduos fazem no Dia de São João. Este momento não faz parte da encenação da Bugiada e Mouriscada, nem é referido na história, mas também faz parte da celebração e da mística do dia.
Os integrantes desses grupos são normalmente de Sobrado, sendo a maioria do sexo masculino, podendo também haver participação individual. Pode ser movimentado a pé ou por veículos (normalmente carroças e manipuladores) transformados em carros alegóricos.
Os temas humorísticos e carnavalescos variam de ano para ano e visam promover a crítica burlesca e espiritual de questões e aventuras relacionadas com a vida local, nacional e internacional, ou de entidades associadas à tradição própria da Bugiada e da Mouriscada.
Colher os D´reitos/ Cobrador
Não é costume usar a designação de Cobrador, no entanto é essa a sua função. Trata-se da primeira personagem da Lavra da Praça e é um Bugio montado ao contrário na garupa dum burro, sendo coadjuvado por outros Bugios. Leva na mão um livro grosso dos direitos a cobrar, escrevendo nele com um pau a fazer de pena, usando como tinteiro o rabo do animal.
Percorre, juntamente com o grupo de Bugios que o acompanha, várias tendas e barraquinhas da festa, cobrando os direitos por meio de gêneros e deixando o seguro recibo.
Semeador
O Semeador, mascarado e vestido com roupas toscas, é a segunda pessoa a entrar no jantar durante a Lavra da Praça e como o nome indica, lança as sensações que estão na praça durante o seu passeio. Desempenha sua função montado no lado oposto do animal, apoiando-o com zinco ou madeira serrada. Ele também contribui para sua labuta por Bugios que encaminham o animal. Sua jornada não tem fim, ou seu saco de serapilheira vazio está sinalizando o fim do seu trabalho.
Gradador/ Homem da grade
O Homem da Grade ou Gradador é o agricultor que com uma grade tosca de madeira, grada a terra, sendo o terceiro personagem da Lavra da Praça.
Percorrer o mesmo percurso do Semeador e as suas vestes, previamente encharcadas na lama, são igualmente rústicas incluindo máscara e chapéu. A nota encontra-se atrelada ao animal e durante o trajeto, por vezes, esta desorienta-se e o Gradador tem de puxar. Tal como os demais personagens dos Serviços da Tarde, interage com o público roçando as suas roupas encantadas nas pessoas. No fim da sua labuta, a série encontra-se completamente destruída, restando alguns paus desengonçados atrelados às correias puxadas pelo burro.
Lavrador/ Homem do arado
O Homem do Arado ou Lavrador é o último personagem da Lavra da Praça a entrar na encenação, seguindo o mesmo trajeto das figuras anteriores. Também mascarado e com chapéu, com vestes agrárias típicas de antigamente e enlameadas, tem como instrumento de trabalho um arado puxado por um burro. Também é auxiliado, por Bugios que conduzem o animal, interagindo e encostando-se ao público.